Boric diz querer boa relação com Brasil, mas que pensa ‘totalmente diferente’ de Bolsonaro

SYLVIA COLOMBO
SANTIAGO, CHILE (FOLHAPRESS) – Foto: Reprodução Twitter/gabrielboric

Em seu primeiro encontro com a imprensa internacional, no Palácio de la Moneda, em Santiago, o recém-empossado presidente do Chile, Gabriel Boric, afirmou que quer ter uma boa relação com o Brasil, mas ressaltou que há grandes divergências entre a agenda de seu governo e a do brasileiro Jair Bolsonaro.

“É evidente que pensamos totalmente diferente do presidente Bolsonaro sobre consciência climática e direitos humanos”, disse Boric nesta segunda (14). “Mas o povo brasileiro o escolheu, e respeitamos isso.”

Boric afirmou ainda ter afinidade com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e que o convidou para sua cerimônia de posse. Segundo ele, o petista recusou para não causar um incômodo diplomático com o atual governo -o que, acrescentou o chileno, representa uma boa característica do petista.
A ex-presidente Dilma Rousseff compareceu ao evento.

Ele também disse que teve conversas com políticos do PT, ressaltou que é preciso “aprender com os erros cometidos” e explicitou apoio no pleito eleitoral deste ano à Presidência: “Estamos torcendo por Lula”.

O novo líder chileno destacou que não participará do Prosul (Foro para o Progresso da América do Sul), uma aliança de governos de direita na América do Sul lançada em 2019, e sinalizou não apoiar a criação de blocos apenas entre presidentes que têm o mesmo perfil ideológico, como seria a aliança criada por seu antecessor, Sebastián Piñera, e integrada também por Brasil, Paraguai e Colômbia.

“Iniciativas de integração que se baseiam em ideologia não funcionam, como o Prosul e o Grupo de Lima”, afirmou. A Argentina havia sido integrada à aliança durante a gestão de Maurício Macri, mas o atual governo, do centro-esquerdista Alberto Fernández, também a abandonou.

O presidente disse ainda que seu país reforçará a participação na Celac (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos), criada em 2010, e na Aliança do Pacífico, formada por Chile, Colômbia, México e Peru desde 2011. Ainda assim, diz ele, o mais importante é a América Latina “voltar a ter voz no mundo”.

Apesar das transformações do modelo chileno que se anunciam com a nova Constituição, Boric afirmou que o Chile sob sua gestão acredita firmemente no multilateralismo. “Sabemos que podemos melhorar alguns aspectos, mas continuaremos muito inseridos no mundo, a partir da América Latina.”

Questionado sobre a tensão migratória no norte do país, causada principalmente pela crise humanitária na Venezuela, disse que conversou com líderes europeus para tentar apresentar aos demais países da região um plano de cotas, como feito na crise na Síria, direcionando imigrantes a vários países. “Claro que não posso impor essas ideias, apenas espero que isso possa ser parte do debate na região.”

A nova ministra do Interior, Izkia Siches, viaja nesta semana para a região fronteiriça para, segundo o governo, conhecer melhor os problemas, conversar com as partes envolvidas e diminuir o nível de tensão.

Sobre economia, Boric afirmou que, embora acredite que o Chile deva continuar com seu modelo de tratados internacionais de livre comércio, é preciso fazer uma mudança no esquema de dependência do modelo extrativista que sustentou a economia do país nos últimos 30 anos.

A respeito dos encontros bilaterais dos últimos dias, disse ter discutido com o líder do Paraguai, Mario Abdo Benítez, o projeto de integração física por meio de um corredor bioceânico, e que, com Luis Arce, da Bolívia, falou sobre melhorar as relações, tensas devido à disputa por uma saída para o mar.
“O Chile não abre mão da soberania sobre seu território, e sei que o presidente Arce precisa fazer sua defesa do mar boliviano, mas é justamente por isso que é preciso conversar”, afirmou o líder chileno.

“Não é possível que a relação de dois países tão próximos culturalmente se veja abalada por isso e tenha registrado bons momentos pela última vez durante as ditaduras militares.”

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